A nossa chave, a nossa Lélia, que tanto abriu portas e mostrou travessuras, encontra agora uma parceira, não menos importante: A TESOURA DE NENÊ. Acreditem: ela não tem nome, mas existe e eu a tenho! Entrou para a família em 1910 para fazer o enxoval de Jarbas. Hoje, cem anos depois, ela mora em Cordeiro/RJ-Rua São Sebastião, 139. É uma senhora muito desgastada, da quarta idade, cheia de histórias. Depois de muito cortar roupas para a primeira e segunda geração dessa família começou a vestir anjos. Sabem quem eram os anjos? Cida e
Ceção! Lembrem-se, Lola também foi Coração de Jesus e a tesoura deve ter trabalhado. Acontece que as roupas de anjo foram muitas... Acontece que esses anjos fizeram história...
Foi assim:
O culto a Nossa Senhora Aparecida mobilizava a zona rural de Cambuci, precisamente a região da Cachoeira, de 1945 em diante. Eram anos difíceis e embora não acompanhássemos os noticiários (não havia TV), havia um terreno fértil para tais práticas em decorrência do período de guerra e dos fatos da política nacional. (A segunda guerra mundial terminara em 1945)
Somam-se ainda a oportunidade de convívio, lazer e socialização que as procissões proporcionavam à população rural.
UM QUADRO de bronze com a silhueta da santa gravada em relevo, mais ou menos do tamanho de um livro, foi adquirido. As famílias organizavam-se para receber a Santa que em suas casas passava a semana. As procissões então aconteciam, a população cantava: ”Daí-nos a Benção oh! Mãe, Querida, Nossa Senhora Aparecida!”
Preces eram feitas. Promessas eram cumpridas... Muitas promessas! Kleber, nosso Binho, estava lá! Quadro da Santa na mão, caminhando em procissão, as “anjas” primas ao seu lado. Estava curado de um sério problema: PARALISIA INFANTIL! Em decorrência da graça alcançada Joaquina fez promessa de não comer doce por um ano e nós, pestinhas que sempre fomos, comemos goiabada em sua frente durante 365 dias.
Não eram só rezas. Eram ladainhas em latim! E a pronuncia... Eram risos, crianças arteiras, jarras cheias de pererecas - para o nosso desespero, velas acesas, orelhas doendo... E doces, muitos doces... Quem os fazia? Vovó Nenê. E o que picotava o papel que embrulhava o doce? A tesoura, parceira de Lélia!
Havia o altar que era montado em cima da mesa da sala da família anfitriã, com caixotes em tamanho decrescente, cobertos com lençol colorido e cocha de renda ou crochê. As flores, colhidas no quintal ou ainda feitas de papel crepom. Nesse altar, jóia apresentada à fé, ficava o Quadro da Santa, as flores, nós – as anjas e os pedidos. Dessa devoção resultou a construção da Capela de Nossa Senhora Aparecida que hoje integra a Paróquia de Nossa Senhora da Conceição, claro em Cambuci /RJ.
Não podemos nos esquecer que foi nesse mesmo período que Jarbas foi a Urucânia – MG libertou-se do alcoolismo e que começou a devoção a Nossa Senhora das Graças.
Resta ainda Dizer que Tia Joaquina e Tia Maria eram Franciscanas, irmãs leigas da ordem de São Francisco, onde exerceram liderança, fizeram um grande trabalho social na Igreja de Porciúncula de Santana em Niterói/RJ.
Maria viveu a emoção de ter ido a Assis, Itália, rezar na terra onde viveu o seu Patrono.
José Renato foi granjeiro em Sobradinho - Brasília e a exemplo de sua mãe, a Francisco entregava a sua criação.
Aconteceu ainda Luisinha de Marilac, trabalho assistencial do qual Lena participou na qualidade de aluna do Colégio São Vicente de Paula, também em Niterói.
É claro que na medida em que a família crescia, filhos e netos casavam-se, outros Santos e Santas passaram a ouvir as nossas preces, porém o imaginário, o sonho e a saudade ficou perdido no meado do século XX.
Nenhum comentário:
Postar um comentário