Em email de 19 de setembro - amiga Madalena Tavares de Miranda
Querida Cida.
Gostei muito da saga familiar que está escrevendo,
iniciativa brilhante de quem alegra a todos com "causos"
vivenciados pelas pessoas que ama e guarda na memória.
Certamente também no coração.
Estou lendo " Paula", de Izabel Allende, um romance autobiográfico,
escrito durante o período em que a filha esteve em coma na Espanha e
me fez em momentos de certa comicidade ligada a personagens familiares,
lembrar de sua saga. E deixo um recado: Já imaginou a riqueza de
seus textos se enxerta nele pinceladas do contexto de época de seus personagens?!
Sua escrita está perfeita, amiga. Além do talento, está explícita sua cultura
literária, fruto de muitas e boas leituras.
Um grande e terno abraço.
Madá
Luciana Robaina TerraMuito Boa a saga! ADOREII!!!! Não sabia q vc escrevia, Parabéns!
BJSSSSS18 set
ISABELA BelaTia Cida , Que maravilha!!!!! Como eu queria ter feito parte da família nesta época. Aqui tá um imenso vazio,sem o alicerce da família que era tia Ceção,a dor não passa, a ferida não cicatriza,não um momento se quer da minha vida que não penso nela,era muito presente em todos os momentos,mas eu tenho uma experiência maravilhosa pra te contar e não posso liberar isso por orkut,quando vc vier pra casa da babi,eu lhe conto o que Deus me concedeu e o fato me confortou muito.ELA SEMPRE ESTARÁ VIVA DENTRO DAS NOSSAS LEMBRANÇAS... Fique com Deus tia Cida e eu quero te ver logo! bjs!
2 set - Vivian/ MauricioLi. Adorei! Parabéns! Bjs.2 set
quarta-feira, 22 de setembro de 2010
sexta-feira, 17 de setembro de 2010
CRENDICES E OUTRAS HISTÓRIAS
DE ANJOS LADAINHAS E PENITENTES
A nossa chave, a nossa Lélia, que tanto abriu portas e mostrou travessuras, encontra agora uma parceira, não menos importante: A TESOURA DE NENÊ. Acreditem: ela não tem nome, mas existe e eu a tenho! Entrou para a família em 1910 para fazer o enxoval de Jarbas. Hoje, cem anos depois, ela mora em Cordeiro/RJ-Rua São Sebastião, 139. É uma senhora muito desgastada, da quarta idade, cheia de histórias. Depois de muito cortar roupas para a primeira e segunda geração dessa família começou a vestir anjos. Sabem quem eram os anjos? Cida e
Ceção! Lembrem-se, Lola também foi Coração de Jesus e a tesoura deve ter trabalhado. Acontece que as roupas de anjo foram muitas... Acontece que esses anjos fizeram história...
Foi assim:
O culto a Nossa Senhora Aparecida mobilizava a zona rural de Cambuci, precisamente a região da Cachoeira, de 1945 em diante. Eram anos difíceis e embora não acompanhássemos os noticiários (não havia TV), havia um terreno fértil para tais práticas em decorrência do período de guerra e dos fatos da política nacional. (A segunda guerra mundial terminara em 1945)
Somam-se ainda a oportunidade de convívio, lazer e socialização que as procissões proporcionavam à população rural.
UM QUADRO de bronze com a silhueta da santa gravada em relevo, mais ou menos do tamanho de um livro, foi adquirido. As famílias organizavam-se para receber a Santa que em suas casas passava a semana. As procissões então aconteciam, a população cantava: ”Daí-nos a Benção oh! Mãe, Querida, Nossa Senhora Aparecida!”
Preces eram feitas. Promessas eram cumpridas... Muitas promessas! Kleber, nosso Binho, estava lá! Quadro da Santa na mão, caminhando em procissão, as “anjas” primas ao seu lado. Estava curado de um sério problema: PARALISIA INFANTIL! Em decorrência da graça alcançada Joaquina fez promessa de não comer doce por um ano e nós, pestinhas que sempre fomos, comemos goiabada em sua frente durante 365 dias.
Não eram só rezas. Eram ladainhas em latim! E a pronuncia... Eram risos, crianças arteiras, jarras cheias de pererecas - para o nosso desespero, velas acesas, orelhas doendo... E doces, muitos doces... Quem os fazia? Vovó Nenê. E o que picotava o papel que embrulhava o doce? A tesoura, parceira de Lélia!
Havia o altar que era montado em cima da mesa da sala da família anfitriã, com caixotes em tamanho decrescente, cobertos com lençol colorido e cocha de renda ou crochê. As flores, colhidas no quintal ou ainda feitas de papel crepom. Nesse altar, jóia apresentada à fé, ficava o Quadro da Santa, as flores, nós – as anjas e os pedidos. Dessa devoção resultou a construção da Capela de Nossa Senhora Aparecida que hoje integra a Paróquia de Nossa Senhora da Conceição, claro em Cambuci /RJ.
Não podemos nos esquecer que foi nesse mesmo período que Jarbas foi a Urucânia – MG libertou-se do alcoolismo e que começou a devoção a Nossa Senhora das Graças.
Resta ainda Dizer que Tia Joaquina e Tia Maria eram Franciscanas, irmãs leigas da ordem de São Francisco, onde exerceram liderança, fizeram um grande trabalho social na Igreja de Porciúncula de Santana em Niterói/RJ.
Maria viveu a emoção de ter ido a Assis, Itália, rezar na terra onde viveu o seu Patrono.
José Renato foi granjeiro em Sobradinho - Brasília e a exemplo de sua mãe, a Francisco entregava a sua criação.
Aconteceu ainda Luisinha de Marilac, trabalho assistencial do qual Lena participou na qualidade de aluna do Colégio São Vicente de Paula, também em Niterói.
É claro que na medida em que a família crescia, filhos e netos casavam-se, outros Santos e Santas passaram a ouvir as nossas preces, porém o imaginário, o sonho e a saudade ficou perdido no meado do século XX.
quarta-feira, 8 de setembro de 2010
SUGESTÕES DE KLEBER
SUGESTÕES RECEBIDAS
KLEBER:
Após o corte da grama onde catávamos todos os resíduos ,todo o quintal era lavado com CREOLINA CRUZVALDINA devido ao coco de MENGO e MENGUISSI,nossos pastores.
2)Não esqueça de falar de DÁRIO,nosso lustrador oficial.(O Rei da Goma Laca)
3)Não esqueça ainda de nossa banda de tampa de panelas ,regida por mim ,Kleber ,com o grande musico Zé de Fulô.
4)Imperdoável não colocar a procissão de Nossa Senhora Aparecida que curou minha paralisia infantil . Da Capelinha até o Valão dos Gomes.
5) Quininha ,cumprindo a promessa que fez a São José passando 1 ano sem comer doces e nós de implicância comendo goiabada em sua frente.
Sem mais para o memento.
Beijo
Kleber.
2)Não esqueça de falar de DÁRIO,nosso lustrador oficial.(O Rei da Goma Laca)
3)Não esqueça ainda de nossa banda de tampa de panelas ,regida por mim ,Kleber ,com o grande musico Zé de Fulô.
4)Imperdoável não colocar a procissão de Nossa Senhora Aparecida que curou minha paralisia infantil . Da Capelinha até o Valão dos Gomes.
5) Quininha ,cumprindo a promessa que fez a São José passando 1 ano sem comer doces e nós de implicância comendo goiabada em sua frente.
Sem mais para o memento.
Beijo
Kleber.
Observo que essas sugestões serão incorporadas ao texto assim como as demais que espero receber de todos vocês. Esta saga é nossa e todos vamos escrever nela.
quinta-feira, 2 de setembro de 2010
A FAMÍLIA CRESCEU
Passados 100 anos do casamento de Nenê e Pompeu estamos na sexta geração da família. Esperamos que cada núcleo aqui formado continue contando essa história e escrevendo o que a sua emoção ditar.
Prima Ceção dizia que tudo isso era mentira da prima Cida.
Se for assim, vou continuar mentindo e escrevendo... Meus filhos: Marcus, Mabel, Maurício, minhas noras e genro: Maria Eneida, Vivian e Cal e minhas netas e neto: Maria Teresa, Anna Carolina, Beatriz e Júlio Marcus serão as minhas próximas vítimas.
Posso lhes assegurar que tudo isso é verdade e que essa verdade cabe no coração de todos nós!
Prima Ceção dizia que tudo isso era mentira da prima Cida.
Se for assim, vou continuar mentindo e escrevendo... Meus filhos: Marcus, Mabel, Maurício, minhas noras e genro: Maria Eneida, Vivian e Cal e minhas netas e neto: Maria Teresa, Anna Carolina, Beatriz e Júlio Marcus serão as minhas próximas vítimas.
Posso lhes assegurar que tudo isso é verdade e que essa verdade cabe no coração de todos nós!
RODAS DE LEITURA
Das histórias que nos foram passadas, nessa tradição familiar de contá-las, orgulhamo-nos do fato de Nenê, já no início do século XX, promover regularmente rodas de leitura. Como dizemos, ela era avançada para o seu tempo. Viajava, mandava os filhos para a cidade grande (Niterói) estudar, comprava óculos, panelas, tecidos para as comadres, mas, sobretudo livros para os netos e para as comadres.
Consta que vovó fazia um emissário à cidade toda semana comprar jornal no trem de ferro, trem expresso, que trazia passageiros, encomendas, jornais... Cabia ao estafeta, funcionário do expresso, entregar as encomendas, vender jornais, anunciar as próximas cidades e paradas, cuidar dos passageiros, etc.
O emissário de Nenê ao retornar era anunciado pelo trote do seu cavalo e à tardinha após a labuta, ao trabalho no campo, homens, mulheres e crianças aproximavam-se da casa do patrão, sentavam-se em roda no terreiro da casa e Nenê lia as notícias.
Era interprete, era mediadora!
Consta que todo jornal era lido e que num determinado dia um dos participantes, convidado para a roda, aí tomou conhecimento da morte de sua mãe quando Nenê lia a seção de anúncios fúnebres. E bom que se esclareça que os compradores de café e mascates em geral, conforme uso na época, costumavam pousar nas casas dos proprietários rurais.
Temos muito que aprender com a nossa avó, aprender a partilhar e a assumir nossa responsabilidade social.
Consta que vovó fazia um emissário à cidade toda semana comprar jornal no trem de ferro, trem expresso, que trazia passageiros, encomendas, jornais... Cabia ao estafeta, funcionário do expresso, entregar as encomendas, vender jornais, anunciar as próximas cidades e paradas, cuidar dos passageiros, etc.
O emissário de Nenê ao retornar era anunciado pelo trote do seu cavalo e à tardinha após a labuta, ao trabalho no campo, homens, mulheres e crianças aproximavam-se da casa do patrão, sentavam-se em roda no terreiro da casa e Nenê lia as notícias.
Era interprete, era mediadora!
Consta que todo jornal era lido e que num determinado dia um dos participantes, convidado para a roda, aí tomou conhecimento da morte de sua mãe quando Nenê lia a seção de anúncios fúnebres. E bom que se esclareça que os compradores de café e mascates em geral, conforme uso na época, costumavam pousar nas casas dos proprietários rurais.
Temos muito que aprender com a nossa avó, aprender a partilhar e a assumir nossa responsabilidade social.
QUITUTES PARA OS NETOS
Muito se falou que Nenê era uma grande cozinheira, mas ainda não foi dito o que mais nos traz saudade. Íamos para os banhos de cachoeira, peraltices outras, comitivas de Pompéu e ao voltar para casa os agrados em forma de guloseimas: eram pães em forma de bichos, biscoitos de polvilho (hoje conhecidos com coruja) e que com auxílio de um saco de confeiteiro escrevia o nome de cada um de nós... Mauro, Ceção, etc. etc.
Vovó forrava a parede da cozinha com papel manilha cor de rosa, daquele que fazia moldes, já existiam os pregos nesse local, um para cada neto e também para os amigos visitantes.. Aí eram pendurados esses agrados. Foram tantos que ficamos gordinhos!
Perguntamos então:
- Podemos ter saudade?
Como sempre existe mais um causo, lembramos que um dia apareceu na Bocaina um cozinheiro chamado Tiburcio. Ele pretendia dar aulas de culinária para vovó, suas filhas e pessoal da cozinha. Propunha ensinar fazer galinha virar peixe e outras falsidades.
Nenê que cozinhava até para o Senhor Perazzo receber Dom Antonio de Castro Maia, bispo da diocese de Campos, fazia bolos confeitados, até um apelidado de “monumento no deserto” não pode concordar com tamanha insensatez. Foi então que Basílio correu com Tiburcio.
Vovó forrava a parede da cozinha com papel manilha cor de rosa, daquele que fazia moldes, já existiam os pregos nesse local, um para cada neto e também para os amigos visitantes.. Aí eram pendurados esses agrados. Foram tantos que ficamos gordinhos!
Perguntamos então:
- Podemos ter saudade?
Como sempre existe mais um causo, lembramos que um dia apareceu na Bocaina um cozinheiro chamado Tiburcio. Ele pretendia dar aulas de culinária para vovó, suas filhas e pessoal da cozinha. Propunha ensinar fazer galinha virar peixe e outras falsidades.
Nenê que cozinhava até para o Senhor Perazzo receber Dom Antonio de Castro Maia, bispo da diocese de Campos, fazia bolos confeitados, até um apelidado de “monumento no deserto” não pode concordar com tamanha insensatez. Foi então que Basílio correu com Tiburcio.
AGRADOS DA ROÇA PARA A CIDADE E DA CIDADE PARA A ROÇA
A Estrada de Ferro Leopoldina era o meio usual de transportar pessoas, coisas e encomendas de Cambuci para Niterói. Foi através de uma dessas encomendas que um belo dia César recebeu um presente especial: uma leitoa viva!
- O que fazer?
- Como matar a leitoa?
Foi aí que Quininha teve a grande idéia: Colocou a bichinha numa bolsa de feira e saiu com Lena, Cida e Binho. Íamos, os três, em solidariedade e fazendo de conta que não era com a gente. Destino: um abatedouro que existia na praia das Flechas e que pertencia a um cunhado do noivo de Cida (Daud).
Essa história tinha que ser confusa, por isso o porco em plena praia de Icaraí pulou da bolsa. A praia cheia, todos correndo atrás do bicho, banhista e nós. A leitoa foi recuperada. Daud a matou e nós a comemos com pompa e circunstância!
É importante lembrar a delícia que era Icaraí: sua areia branca, água morna e limpa, seu trampolim (cartão postal da época), a mocidade bonita, feliz e glamorosa, mas que ainda usava maiô e bóia de pneu usado. (Era o retrato de uma época – meado do século XX)
- O que fazer?
- Como matar a leitoa?
Foi aí que Quininha teve a grande idéia: Colocou a bichinha numa bolsa de feira e saiu com Lena, Cida e Binho. Íamos, os três, em solidariedade e fazendo de conta que não era com a gente. Destino: um abatedouro que existia na praia das Flechas e que pertencia a um cunhado do noivo de Cida (Daud).
Essa história tinha que ser confusa, por isso o porco em plena praia de Icaraí pulou da bolsa. A praia cheia, todos correndo atrás do bicho, banhista e nós. A leitoa foi recuperada. Daud a matou e nós a comemos com pompa e circunstância!
É importante lembrar a delícia que era Icaraí: sua areia branca, água morna e limpa, seu trampolim (cartão postal da época), a mocidade bonita, feliz e glamorosa, mas que ainda usava maiô e bóia de pneu usado. (Era o retrato de uma época – meado do século XX)
Naquela época Joaquina morava na Alameda 24 de outubro, Santa Teresa e através da Alameda Carolina chegávamos ao Canto do Rio - praia de Icaraí e foi fazendo esse trajeto que corremos atrás da leitoa, nós e muitos outros, até a praia das Flechas. Era uma casa confortável, com um jardim gramado que César podava e que tínhamos de ajudar: varrer grama, carregar, jogar no lixo, tudo com cuidado e bem feito e desinfetado com a famosa creolina Cruzvaldina.Não podemos deixar de falar nos nossos pastores- Mengo e Menguissi- cachorros de estimação - que sujavam e nós limpávamos. Na conservação da casa atuava também Dario, outro agregado, que era o rei da goma laca - lustrador oficial que atendia ao padrão exigido
Era um suplicio! Eles obedeciam a moça bonita e a moça era Quininha , a amada de César.Tínhamos que fazer. Fazíamos. Gostaríamos de fazer de novo – todos nós!
Da cidade vinham os vestidos bonitos, as fantasias de carnaval que Joaquina fazia para as sobrinhas. Vinham na bagagem de vovó: maçãs, laranja Bahia, latas de biscoito coloridas cujo conteúdo era separado com papel branco corrugado e os biscoitos arrumados por feitio e sabor. Um luxo para a época. Porém o mais importante: cartilhas ilustradas que teimávamos em ler cágado quando a inscrição era jabuti. Também vinham livros de estórias, ilustrados, lindos e depois livros para moças, coleção cor de rosa, M. Dely (não sei se era essa a grafia – nunca foi boa nisso) Ensinou-nos a ler – VIVA VOVÓ!
FESTAS E TIPOS POPULARES QUE ENCANTARAM A NOSSA INFÂNCIA
Dentro os tipos populares que enfeitaram a nossa infância não podemos de nos esquecer de Paulo Coelho e Izabel. Eles visitavam as famílias da região, cantavam, tocavam chocalhos e pandeiro e finalizando a apresentação pediam desculpas pelos erros daquela Fraca Orquestra. É oportuno que se diga que passados muitos e muitos anos, em 1979, nascia em Cordeiro-RJ, um bloco carnavalesco de nome Orquestra Fraca. Como não podia deixar de ser, por obra e graça dos netos e bisnetos de Nenê e Pompeu. A Orquestra Fraca foi criada por Marcus, neto de Maria José e seus amigos. Eram todos adolescentes e com este nome homenagearam as histórias que lhes eram contadas com carinho e saudade. Os filhos e netos de Joaquina também participavam dessa festa: Kleber vinha com a família de Belo Horizonte, assim como, Lena e Denise de Niterói. Era uma grande bagunça, uma grande alegria, uma família unida - 3 gerações em festa! Maria José acolhia todos!
Ainda existiu o cego, Santinho.
Ele era violeiro. Hospedáva-se em casa de Hermes Bastos, vizinho, parente e amigo da Cachoeira. Íamos todos para lá, sempre, e ficávamos encantados. Era o único cego que conhecíamos e ele andava sozinho e tocava violão e cantava modinhas.
Acredito que venha dessa época o interesse de Lena, filha de Joaquina, pela tarefa que hoje lhe cabe: ler para cegos em uma instituição social em Niterói-Rj, na qualidade de voluntária.
Da safra de artistas é bom que se fale em Dinho Azeredo, namorado de Ana, filha de compadre Cartola, agregado de César e Joaquina. Dinho cantava as músicas de Anísio Silva num programa de calouros da Rádio Nacional. Era uma grande emoção. Ele cantava: “quero beijar-te as mãos minha querida”. Ana chorava e nós aplaudíamos.
E aconteciam ainda os bailes de roça, ao som da sanfona, do gramofone ou do piano. Existia ainda Bibi, que tocava violino. O gramofone e o piano pertenciam à dona Zilda Gomes, vizinha, moradora no Valão dos Gomes, assim como Bibi que morava em sítio bem próximo. Desses bailes nunca nos esqueceremos da comadre Mariana para quem o cantor dizia: “ginga comadre Mariana, ginga comadre Mariana!...”
Costumávamos também ser dama de casamento. Num deles, na zona rural – caminho da Cachoeira casou-s Anita, filha de Fidélis Carvalho e Vivinha (família de Estolaninho). Cida foi dama. A festa animada. O noivo doutor, médico. Acontece que a cozinha fervilhava, quitutes saindo fresquinhos ou quentinhos. Tudo um primor. Mas daí, de repente, convidados vomitando por todo lado. Cena de filme de terror. Investiga-se de lá e de cá e descobre-se: - envenenamento por arsênico (um resto do veneno usado para matar formigas estava num armário. A cozinheira contratada para a festa o confundiu com trigo e misturou essa pequena sobra na lata da farinha. Usou para pastéis. Cida comeu dessa massa crua e passou muito mal. Os médicos convidados e o noivo mandaram que fossem batidas muitas e muitas claras de ovo e tomadas com água morna para provocar vômitos e cuidar do envenenamento. Estolaninho, prático, tirou e mandou tirar muito leite de vacas que em seu cavalo distribuiu nas casas dos envenenados. Salvaram-se todos e o casamento durou “na alegria e na tristeza até que a morte os separou”.
Também é da família de Fidelis Carvalho e Vivinha a oração que fazíamos quando caminhávamos no escuro e com medo de cobras nas estradas da Cachoeira ou da Bocaina, era assim:
“São Bento e água benta,
Jesus Cristo no altar,
Cobra que nos desejais mal
Deixa eu passar.” (esta oração faz parte da nossa infância e foi recordada por Expedito, sobrinho de Estolaninho, filho de sua irmã Vivinha.)
Vovó Nenê também fazia doces para o casamento das afilhadas (eram muitas), os ingredientes fornecidos pelas noivas nunca preenchiam as exigências dessa doceira e assim Estolaninho e Basílio tinham que “pagar o pato”. Outro que sempre se dava mal em tais festas era Mauro, o nosso Capitão (filho de Lola e Basílio). Cabia a ele a responsabilidade de levar os doces e ainda representar Nenê e Pompeu na cerimônia. Quando íamos todos era muito bom, muita festa, muita dança em “latada” (barraca montada com bambus), troca de roupa da noiva e de alguns convidados duas ou três vezes durante a festa. Quando ia sozinho ficava difícil, muito difícil!
Precisamos dizer que estes doces eram transportados em carro de bois e que este era o transporte usual na época. Nele era transportada toda a safra, fosse ela de cana de açúcar, café, ou outra, assim como móveis, lenha e ainda famílias para deslocamento na zona rural ou desta para a cidade, isto quando as viagens não eram feitas a cavalo.
Com relação ao carro de bois, que fique bem claro a sua importância. Na época a cultura da cana de açúcar era a principal atividade econômica da região e toda a produção, inclusive a nossa, era por ele transportada para a Companhia Minério Agrícola (usina de açúcar) por esses carros.
Bois em suas cangas, atrelados aos pares, num trabalho de força e coletivo, eram embalados pelo canto peculiar do carro - que mais parecia um lamento. Puxavam o “ouro branco”, faziam a economia girar, escoavam a produção. Obedeciam ao candeeiro com a sua vara de ferrão e à voz do carreiro que dizia os seus nomes – ei boi, ei Estrela, ei Malhado, vamos, ôa vamos!...
Um dia a usina abriu falência, suas cotas foram vendidas para uma usina do Estado de São Paulo e Cambuci nunca mais foi à mesma.
Mais tarde o Caminhão começou a ser usado, mas o que povoa a nossa infância é o caminhão do Senhor Zerinho, pai de Zélia que se casou com Antonio, filho de Jarbas e Lívia.
O carro de bois é o símbolo de uma época.
Lembramos também das histórias de Zeca Lacerda, primo “maluco” de tio Basílio. Zeca percorria a zona rural, pintava-se com sementes de urucum, procurava nascentes de água, obedecia a Lola literalmente. Certo dia Lola mandou que ele fosse comprar canela numa vendinha para fazer doce e ele entendeu que era canela, perna da moça que o atendeu. Foi uma correria um grande pavor. Foram muitas as loucuras deste cidadão.
Ainda na Bocaina, residia o casal Dona Lucila e o Senhor Veloso. Pedro Antonio ia a casa dele todos os dias, tomava o café todo no bico do bule, comia todo o almoço e ao casal só restava o recurso de ir à casa de Basílio e dizer: Dona Lola, o menino comeu e bebeu tudo, viemos almoçar!
Era este senhor quem fazia o azeite de mamona e por pouco não foi ele quem inventou o bio diesel. Certo dia ele ficou tuberculoso e não se sabe como Pedro não foi contaminado.
Na Cachoeira não podem ser esquecidos Olimpio Melo e sua mulher Madalena. Madalena vivia reclusa. O marido não a deixava sair de casa, sequer receber visitas. Ninguém a conhecia. Certo dia o marido adoeceu, não conseguia levantar-se. Ela teve que buscar socorro. Foi aí que Cida e Ceção deparararam-se com aquela mulher que gesticulava, não falava, suja, um espantalho! Saíram correndo e gritando. Maria José entrou em ação, conseguiu identificar a mulher e todos juntos fomos ajudar e conhecer aquele sítio que tanto nos amedrontava, que era cheio de cabritos e “causos de pavor”.
Desde então passamos a ajudar Madalena. Todas as vezes que o marido ia às compras ela fugia para a nossa casa para ver gente e comer melhor. Um dia Olimpio Melo foi brutalmente assassinado. Seu assassino julgado e condenado e Madalena foi acolhida por parentes que moravam em Niterói.
Nunca mais soubemos dela.
Ainda existiu o cego, Santinho.
Ele era violeiro. Hospedáva-se em casa de Hermes Bastos, vizinho, parente e amigo da Cachoeira. Íamos todos para lá, sempre, e ficávamos encantados. Era o único cego que conhecíamos e ele andava sozinho e tocava violão e cantava modinhas.
Acredito que venha dessa época o interesse de Lena, filha de Joaquina, pela tarefa que hoje lhe cabe: ler para cegos em uma instituição social em Niterói-Rj, na qualidade de voluntária.
Da safra de artistas é bom que se fale em Dinho Azeredo, namorado de Ana, filha de compadre Cartola, agregado de César e Joaquina. Dinho cantava as músicas de Anísio Silva num programa de calouros da Rádio Nacional. Era uma grande emoção. Ele cantava: “quero beijar-te as mãos minha querida”. Ana chorava e nós aplaudíamos.
E aconteciam ainda os bailes de roça, ao som da sanfona, do gramofone ou do piano. Existia ainda Bibi, que tocava violino. O gramofone e o piano pertenciam à dona Zilda Gomes, vizinha, moradora no Valão dos Gomes, assim como Bibi que morava em sítio bem próximo. Desses bailes nunca nos esqueceremos da comadre Mariana para quem o cantor dizia: “ginga comadre Mariana, ginga comadre Mariana!...”
Costumávamos também ser dama de casamento. Num deles, na zona rural – caminho da Cachoeira casou-s Anita, filha de Fidélis Carvalho e Vivinha (família de Estolaninho). Cida foi dama. A festa animada. O noivo doutor, médico. Acontece que a cozinha fervilhava, quitutes saindo fresquinhos ou quentinhos. Tudo um primor. Mas daí, de repente, convidados vomitando por todo lado. Cena de filme de terror. Investiga-se de lá e de cá e descobre-se: - envenenamento por arsênico (um resto do veneno usado para matar formigas estava num armário. A cozinheira contratada para a festa o confundiu com trigo e misturou essa pequena sobra na lata da farinha. Usou para pastéis. Cida comeu dessa massa crua e passou muito mal. Os médicos convidados e o noivo mandaram que fossem batidas muitas e muitas claras de ovo e tomadas com água morna para provocar vômitos e cuidar do envenenamento. Estolaninho, prático, tirou e mandou tirar muito leite de vacas que em seu cavalo distribuiu nas casas dos envenenados. Salvaram-se todos e o casamento durou “na alegria e na tristeza até que a morte os separou”.
Também é da família de Fidelis Carvalho e Vivinha a oração que fazíamos quando caminhávamos no escuro e com medo de cobras nas estradas da Cachoeira ou da Bocaina, era assim:
“São Bento e água benta,
Jesus Cristo no altar,
Cobra que nos desejais mal
Deixa eu passar.” (esta oração faz parte da nossa infância e foi recordada por Expedito, sobrinho de Estolaninho, filho de sua irmã Vivinha.)
Vovó Nenê também fazia doces para o casamento das afilhadas (eram muitas), os ingredientes fornecidos pelas noivas nunca preenchiam as exigências dessa doceira e assim Estolaninho e Basílio tinham que “pagar o pato”. Outro que sempre se dava mal em tais festas era Mauro, o nosso Capitão (filho de Lola e Basílio). Cabia a ele a responsabilidade de levar os doces e ainda representar Nenê e Pompeu na cerimônia. Quando íamos todos era muito bom, muita festa, muita dança em “latada” (barraca montada com bambus), troca de roupa da noiva e de alguns convidados duas ou três vezes durante a festa. Quando ia sozinho ficava difícil, muito difícil!
Precisamos dizer que estes doces eram transportados em carro de bois e que este era o transporte usual na época. Nele era transportada toda a safra, fosse ela de cana de açúcar, café, ou outra, assim como móveis, lenha e ainda famílias para deslocamento na zona rural ou desta para a cidade, isto quando as viagens não eram feitas a cavalo.
Com relação ao carro de bois, que fique bem claro a sua importância. Na época a cultura da cana de açúcar era a principal atividade econômica da região e toda a produção, inclusive a nossa, era por ele transportada para a Companhia Minério Agrícola (usina de açúcar) por esses carros.
Bois em suas cangas, atrelados aos pares, num trabalho de força e coletivo, eram embalados pelo canto peculiar do carro - que mais parecia um lamento. Puxavam o “ouro branco”, faziam a economia girar, escoavam a produção. Obedeciam ao candeeiro com a sua vara de ferrão e à voz do carreiro que dizia os seus nomes – ei boi, ei Estrela, ei Malhado, vamos, ôa vamos!...
Um dia a usina abriu falência, suas cotas foram vendidas para uma usina do Estado de São Paulo e Cambuci nunca mais foi à mesma.
Mais tarde o Caminhão começou a ser usado, mas o que povoa a nossa infância é o caminhão do Senhor Zerinho, pai de Zélia que se casou com Antonio, filho de Jarbas e Lívia.
O carro de bois é o símbolo de uma época.
Lembramos também das histórias de Zeca Lacerda, primo “maluco” de tio Basílio. Zeca percorria a zona rural, pintava-se com sementes de urucum, procurava nascentes de água, obedecia a Lola literalmente. Certo dia Lola mandou que ele fosse comprar canela numa vendinha para fazer doce e ele entendeu que era canela, perna da moça que o atendeu. Foi uma correria um grande pavor. Foram muitas as loucuras deste cidadão.
Ainda na Bocaina, residia o casal Dona Lucila e o Senhor Veloso. Pedro Antonio ia a casa dele todos os dias, tomava o café todo no bico do bule, comia todo o almoço e ao casal só restava o recurso de ir à casa de Basílio e dizer: Dona Lola, o menino comeu e bebeu tudo, viemos almoçar!
Era este senhor quem fazia o azeite de mamona e por pouco não foi ele quem inventou o bio diesel. Certo dia ele ficou tuberculoso e não se sabe como Pedro não foi contaminado.
Na Cachoeira não podem ser esquecidos Olimpio Melo e sua mulher Madalena. Madalena vivia reclusa. O marido não a deixava sair de casa, sequer receber visitas. Ninguém a conhecia. Certo dia o marido adoeceu, não conseguia levantar-se. Ela teve que buscar socorro. Foi aí que Cida e Ceção deparararam-se com aquela mulher que gesticulava, não falava, suja, um espantalho! Saíram correndo e gritando. Maria José entrou em ação, conseguiu identificar a mulher e todos juntos fomos ajudar e conhecer aquele sítio que tanto nos amedrontava, que era cheio de cabritos e “causos de pavor”.
Desde então passamos a ajudar Madalena. Todas as vezes que o marido ia às compras ela fugia para a nossa casa para ver gente e comer melhor. Um dia Olimpio Melo foi brutalmente assassinado. Seu assassino julgado e condenado e Madalena foi acolhida por parentes que moravam em Niterói.
Nunca mais soubemos dela.
Tínhamos uma banda de música de tampas de lata e o nosso maestro era Zé de Fulô. Era uma desafinação só, e nós além de desastrados ficávamos mais atrapalhados ao acompanhar o maestro. Zé era da turma de Tio Clemente, portanto, um jovem especial que tinha um embornal de leitura e era nosso aluno! Acho que essa banda era a Orquestra Fraca dos netos de Nenê e Pompéu,enquanto a de Cordeiro era a dos bisnetos.
FOLCLORE, FOLIA DE REIS E CAXAMBU
Como não podia deixar de ser, nós- os netos de Nenê e Pompeu, fizemos amizade com as figuras populares do lugar e tivemos contato íntimo com as manifestações folclóricas cultivadas em nossa Cambuci na segunda metade do século XX.
Dentre estas destacamos A FOLIA DE REIS e o CAXAMBU.
Vivemos, a cada ano, a emoção da Folia de Reis. Era sempre na época do Natal. Os primos e os amigos ficavam concentrados na nossa casa na Cachoeira. Deitávamos cedo e ficávamos aguardando a batida da porteira que anunciava a chegada dos reis e quietinhos aguardávamos o canto dos foliões anunciando a chegada e pedindo permissão para entrar na nossa casa. Era o Menino Deus que chegava... Sua bandeira e seu séquito seriam recebidos após a terceira invocação: “... e abre a porta e recebei esta bandeira”. A emoção era grande, a bandeira recebida por meu pai percorria abençoando toda casa e toda a família. Era então cantada a história do nascimento do Menino Jesus e a perseguição por Ele sofrida pelos soldados de Herodes. Chegado o momento da apresentação dos palhaços que usavam máscaras terríveis de pelo de cabra, roupas coloridas de chita enfeitadas com fitas, espelhos, franjas e dançavam e diziam versos, o medo inicial era substituído pela alegria. Cada criança jogava moedas para o palhaço em reconhecimento aos versos que ele improvisava e cujo assunto era os causos da nossa família, da nossa roça, da nossa plantação. Garanto que era muita emoção! As moedas eram muitas. Significativa era a contribuição colocada na bandeira, para festa da folia. Saboroso e farto o lanche a eles servidos e preparado pela vovó Nenê. São memoráveis estas noites de amigos, medo, encantamento, folclore... Quanta saudade!
O CAXAMBU nos remete à Bocaina, casa de Lola, dia 29 de junho, Dia de São Pedro, aniversário de Pedro Antonio. Dia de festa, comilança, doces de Vovó Nenê... Terreiro da Bocaina enfeitado, fogueira acesa, primos, amigos, colonos... Tudo era festa. É aí que acontece a roda de Caxambu. Os tambores tocam, a cuíca puxa o canto e então mensagens em código são passadas e cabe a um dos participantes decodificá-las. Ficávamos muito impressionados, aquilo para nós era muito difícil. Sabíamos, então, que aquela era a maneira pela qual os escravos se comunicavam de senzala para senzala denunciando abusos, planejando fugas... Isto nos foi ensinado por Basílio e revivido muitas e muitas vezes. Vida longa ao Primo Pedro cujo aniversário nos proporcionava alegria, reflexão e cultura!
Dentre estas destacamos A FOLIA DE REIS e o CAXAMBU.
Vivemos, a cada ano, a emoção da Folia de Reis. Era sempre na época do Natal. Os primos e os amigos ficavam concentrados na nossa casa na Cachoeira. Deitávamos cedo e ficávamos aguardando a batida da porteira que anunciava a chegada dos reis e quietinhos aguardávamos o canto dos foliões anunciando a chegada e pedindo permissão para entrar na nossa casa. Era o Menino Deus que chegava... Sua bandeira e seu séquito seriam recebidos após a terceira invocação: “... e abre a porta e recebei esta bandeira”. A emoção era grande, a bandeira recebida por meu pai percorria abençoando toda casa e toda a família. Era então cantada a história do nascimento do Menino Jesus e a perseguição por Ele sofrida pelos soldados de Herodes. Chegado o momento da apresentação dos palhaços que usavam máscaras terríveis de pelo de cabra, roupas coloridas de chita enfeitadas com fitas, espelhos, franjas e dançavam e diziam versos, o medo inicial era substituído pela alegria. Cada criança jogava moedas para o palhaço em reconhecimento aos versos que ele improvisava e cujo assunto era os causos da nossa família, da nossa roça, da nossa plantação. Garanto que era muita emoção! As moedas eram muitas. Significativa era a contribuição colocada na bandeira, para festa da folia. Saboroso e farto o lanche a eles servidos e preparado pela vovó Nenê. São memoráveis estas noites de amigos, medo, encantamento, folclore... Quanta saudade!
O CAXAMBU nos remete à Bocaina, casa de Lola, dia 29 de junho, Dia de São Pedro, aniversário de Pedro Antonio. Dia de festa, comilança, doces de Vovó Nenê... Terreiro da Bocaina enfeitado, fogueira acesa, primos, amigos, colonos... Tudo era festa. É aí que acontece a roda de Caxambu. Os tambores tocam, a cuíca puxa o canto e então mensagens em código são passadas e cabe a um dos participantes decodificá-las. Ficávamos muito impressionados, aquilo para nós era muito difícil. Sabíamos, então, que aquela era a maneira pela qual os escravos se comunicavam de senzala para senzala denunciando abusos, planejando fugas... Isto nos foi ensinado por Basílio e revivido muitas e muitas vezes. Vida longa ao Primo Pedro cujo aniversário nos proporcionava alegria, reflexão e cultura!
ASSOMBRAÇÕES, FANTASMAS E ALMAS PENADAS
Como todas as crianças, também nós gostávamos dessas histórias.
O terreno era fértil. Aonde íamos entravamos o cenário perfeito: a cachoeira e o cemitério.
A cachoeira onde tomávamos banho em companhia de patos e gansos, o riacho que cortava a nossa plantação de arroz era, e ainda é visitado por uma noiva nas noites de lua cheia.
Essa história, até hoje, faz parte do folclore local.
A noiva é nossa: os antepassados da família do meu pai (Antonio/Titino ou Estolaninho, como preferir) proprietários deste cenário criaram uma prima muito bonita de rosto, mas portadora de um defeito físico que prejudicava o seu caminhar.
Estava ela num baile quando foi convidada a dançar. O cavalheiro não a conhecia e por isso espantou-se com o seu passo de dança. Riu, zoou como se diz hoje. Na madrugada desse mesmo dia ela jogou-se na cachoeira e uma alma penada vestida de noiva nasceu. A noiva é nossa!
Aconteceu ainda o seguinte assombramento: Morreu uma prima de Estolaninho e muitas crianças ficaram órfãs. Os parentes foram convidados a assumir estas crianças. Caberia a ele e a sua mulher, Maria José, a responsabilidade de cuidar de um menino de nome Anísio. Maria José recusou-se. Foi então que nas primeiras horas da madrugada, logo após Estolaninho ir para a lida do canavial que a porta do quarto se abriu. Maria José viu entrar uma moça clara, cabelos castanhos, magra, vestido estampado que a ela se dirigiu assim:
- “por que você não quer cuidar do meu filho? Você também é mãe”!
Nenê no quarto ao lado perguntou à filha com quem ela estava conversando e ela respondeu que era com a mãe de Anísio. Vovó veio ao seu encontro e a moça da mesma forma que chegou, foi embora. Convocaram os parentes, a descrição combinava com a da finada, inclusive o figurino. Moral da história: por remorso ou medo cuidaram de Anísio, lhe deram carinho, escola e um cavalo. Quando crescido pode voltar para a casa paterna e levou o seu cavalo. Nunca mais vimos Anísio.
Já foi dito que andávamos atrás de vovó. Quando ela estava na casa de um filho ou filha mandava que vovô levasse seus doces e pães para presentear os demais. Vovô andava com os netos em comitiva. Ele em seu cavalo Pachola e cada um de nós no seu próprio cavalo. O meu era o Ialú, no qual eu era a rainha da cachoeira.
Nunca tivemos medo de cemitério nem de mortos. Nossa avó desde muito cedo nos levava a velório. Plantava flores e em nossa companhia as levava para os velórios das criancinhas e outras colonos que morriam na Cachoeira ou na Bocaina. Os caixões (urnas) eram feitos por carpinteiro ou prático nos quintais das casas, quando necessário. Era uma armação de madeira coberta de tecido roxo, branco, rosa, azul se para adulto, virgem, menino ou menina. Dependendo da importância do morto, enfeitado com galões e afins. Nossos avós e pais respeitavam a vida e a morte, falavam conosco da importância da de solidariedade, responsabilidade para com os trabalhadores, necessidade de socorro e prevenção, combate a mortalidade infantil, etc.
Foi assim que aprendemos!
Vovó não era de freqüentar igreja ou de rezar muito, embora tivesse sua santa de devoção e na parede do seu quarto uma cantoneira de madeira com a imagem da mesma: Nossa Senhora da Apparecida.
Agradecemos a herança de participação e responsabilidade social, exemplo que imprimiu em todos nós.
Acontece que no caminho da Bocaina havia um cemitério velho e abandonado, Cemitério do Nico Terra (parente de Basílio). Aí era o nosso Oasis...
Entrávamos no campo santo, amarrávamos o nosso cavalo no fim do terreno, no meio das árvores, fora do alcance do olhar de quem passasse na estrada. Brincávamos, brincávamos muito! Colhíamos mel, separávamos ossos dos falecidos para vovô nos ensinar os nomes. Foram as primeiras e as mais ricas aulas de anatomia de nossas vidas. Fazíamos pic-nic num túmulo mais conservado e com uma grade. Esse era o túmulo de Dona Minervina Cruz, minha tetravó paterna.
Como vê, tudo gira em torno da família que tinha muitos agregados, uma chave misteriosa e tem ainda uma tesoura centenária.
Acontece que começaram os rumores: - o cemitério do Nico Terra está assombrado, anjinhos brincam aí, dão risadas...
O medo foi estabelecido, ampliado, multiplicado. Ninguém mais passava aí depois que escurecia... As meninas de Pompeu descobriram o mistério: éramos nós indo ou vindo da Bocaina!
O terreno era fértil. Aonde íamos entravamos o cenário perfeito: a cachoeira e o cemitério.
A cachoeira onde tomávamos banho em companhia de patos e gansos, o riacho que cortava a nossa plantação de arroz era, e ainda é visitado por uma noiva nas noites de lua cheia.
Essa história, até hoje, faz parte do folclore local.
A noiva é nossa: os antepassados da família do meu pai (Antonio/Titino ou Estolaninho, como preferir) proprietários deste cenário criaram uma prima muito bonita de rosto, mas portadora de um defeito físico que prejudicava o seu caminhar.
Estava ela num baile quando foi convidada a dançar. O cavalheiro não a conhecia e por isso espantou-se com o seu passo de dança. Riu, zoou como se diz hoje. Na madrugada desse mesmo dia ela jogou-se na cachoeira e uma alma penada vestida de noiva nasceu. A noiva é nossa!
Aconteceu ainda o seguinte assombramento: Morreu uma prima de Estolaninho e muitas crianças ficaram órfãs. Os parentes foram convidados a assumir estas crianças. Caberia a ele e a sua mulher, Maria José, a responsabilidade de cuidar de um menino de nome Anísio. Maria José recusou-se. Foi então que nas primeiras horas da madrugada, logo após Estolaninho ir para a lida do canavial que a porta do quarto se abriu. Maria José viu entrar uma moça clara, cabelos castanhos, magra, vestido estampado que a ela se dirigiu assim:
- “por que você não quer cuidar do meu filho? Você também é mãe”!
Nenê no quarto ao lado perguntou à filha com quem ela estava conversando e ela respondeu que era com a mãe de Anísio. Vovó veio ao seu encontro e a moça da mesma forma que chegou, foi embora. Convocaram os parentes, a descrição combinava com a da finada, inclusive o figurino. Moral da história: por remorso ou medo cuidaram de Anísio, lhe deram carinho, escola e um cavalo. Quando crescido pode voltar para a casa paterna e levou o seu cavalo. Nunca mais vimos Anísio.
Já foi dito que andávamos atrás de vovó. Quando ela estava na casa de um filho ou filha mandava que vovô levasse seus doces e pães para presentear os demais. Vovô andava com os netos em comitiva. Ele em seu cavalo Pachola e cada um de nós no seu próprio cavalo. O meu era o Ialú, no qual eu era a rainha da cachoeira.
Nunca tivemos medo de cemitério nem de mortos. Nossa avó desde muito cedo nos levava a velório. Plantava flores e em nossa companhia as levava para os velórios das criancinhas e outras colonos que morriam na Cachoeira ou na Bocaina. Os caixões (urnas) eram feitos por carpinteiro ou prático nos quintais das casas, quando necessário. Era uma armação de madeira coberta de tecido roxo, branco, rosa, azul se para adulto, virgem, menino ou menina. Dependendo da importância do morto, enfeitado com galões e afins. Nossos avós e pais respeitavam a vida e a morte, falavam conosco da importância da de solidariedade, responsabilidade para com os trabalhadores, necessidade de socorro e prevenção, combate a mortalidade infantil, etc.
Foi assim que aprendemos!
Vovó não era de freqüentar igreja ou de rezar muito, embora tivesse sua santa de devoção e na parede do seu quarto uma cantoneira de madeira com a imagem da mesma: Nossa Senhora da Apparecida.
Agradecemos a herança de participação e responsabilidade social, exemplo que imprimiu em todos nós.
Acontece que no caminho da Bocaina havia um cemitério velho e abandonado, Cemitério do Nico Terra (parente de Basílio). Aí era o nosso Oasis...
Entrávamos no campo santo, amarrávamos o nosso cavalo no fim do terreno, no meio das árvores, fora do alcance do olhar de quem passasse na estrada. Brincávamos, brincávamos muito! Colhíamos mel, separávamos ossos dos falecidos para vovô nos ensinar os nomes. Foram as primeiras e as mais ricas aulas de anatomia de nossas vidas. Fazíamos pic-nic num túmulo mais conservado e com uma grade. Esse era o túmulo de Dona Minervina Cruz, minha tetravó paterna.
Como vê, tudo gira em torno da família que tinha muitos agregados, uma chave misteriosa e tem ainda uma tesoura centenária.
Acontece que começaram os rumores: - o cemitério do Nico Terra está assombrado, anjinhos brincam aí, dão risadas...
O medo foi estabelecido, ampliado, multiplicado. Ninguém mais passava aí depois que escurecia... As meninas de Pompeu descobriram o mistério: éramos nós indo ou vindo da Bocaina!
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